segunda-feira, 8 de abril de 2013

Empresas que editam DVDs de boleiros veem preconceito e usam macetes para 'pernas de pau'

Empresas se especializam em produção de vídeos para divulgar jogadores de futebol
Empresas se especializam em produção de vídeos para divulgar jogadores de futebol


Uma das novidades que a modernidade trouxe às relações clássicas do futebol é o uso do vídeo para apresentar o trabalho dos profissionais da bola. Há pouco mais de dez anos as contratações de jogadores através de DVDs eram tratadas quase como um incidente folclórico, mas hoje em dia este recurso se sofisticou através de empresas dedicadas exclusivamente ao serviço, com capacidade até para melhorar a apresentação de um “perna de pau”. Mesmo assim, o preconceito contra a atividade ainda existe entre empresários e clubes.
A reportagem do UOL Esporte visitou a sede da ARF Sports em São Paulo, uma das empresas líderes do segmento. A companhia oferece serviços como edição de DVDs motivacionais, aqueles exibidos em vestiários antes de partidas decisivas, e também prepara o currículo visual de atletas, com finalidade de apresentação no Brasil e no exterior. Apesar de entregarem trabalhos para nomes conhecidos como Neymar e Marcos, ainda enfrentam resistência pela natureza do trabalho.
"Nós encontramos preconceitos, não diretamente ao nosso trabalho. Hoje já é uma unanimidade que os DVDs são necessários ao futebol. Antigamente se tinha uma ideia errada de que o DVD enganava os times. Eu não sei no passado como era feito. Hoje mostra as qualidades do atleta. E cabe à comissão técnica, ao clube, desenvolver as deficiências, para aprimorar esse atleta", diz Ivan Ricardo, um dos sócios da ARF Sports.


"Existem empresas que trabalham com edição de vídeos de casamento, de aniversário, e acham que conseguem editar um vídeo de futebol. E de repente não sabe a diferença de um lateral com um ala, por exemplo. É comum ver um material desses de um zagueiro abrindo com seis ou sete gols. Ele não está lá para ser contratado pelos gols, está lá para ser contratado pela marcação", acrescenta o empresário, sobre o setor amador que coexiste na oferta de mercado de edição.
A empresa na Zona Oeste de São Paulo hoje opera com pouco mais de dez funcionários, divididos entre decupagem de jogos, edição, arte e captação de vídeos. O serviço usa imagens de transmissões de TV, mas também produz material próprio, às vezes até com locutor.
Nesta empresa, o custo mínimo de um DVD é de R$ 400, mas a média de serviço fica entre R$ 1 mil e 1,2 mil, dependendo da quantidade de material a ser editada. Trabalhos mais extensos podem chegar até R$ 8 mil.
A ARF diz que não tem nenhum envolvimento em negociações, apesar da parceria com alguns empresários, restrita à divulgação de jogadores. Os produtores de DVDs comemoram sucessos de trabalhos como o que levou o volante Romulo á Fiorentina, entre outros.
"Ano passado fui para os Emirados Árabes, meu material foi visto fora do país. Um trabalho muito bom, tenho mais de um ano que trabalho com eles. Fui para o exterior através do material deles. Foi interessante financeiramente, também aprendi bastante. Pude crescer profissional", relata o volante Serginho, hoje no Bragantino, sobre a aposta no serviço.
Em alguns clubes a empresa encontra restrição de circulação entre jogadores, mas em outros tem liberdade até para sugerir nomes para contratação, como no Mirassol e no Oeste de Itápolis.
Por outro lado, existem jogadores que procuram o serviço mais para contar com um acervo organizado de carreira, e menos para buscar uma colocação. Este é o caso do santista Edu Dracena e do ex-goleiro Marcos. O estafe de Neymar também fez uma encomenda semelhante. Outro exemplo é o zagueiro Álvaro, hoje no Linense, que deixou na empresa uma caixa lotada de material de suas passagens por São Paulo, Flamengo e Espanha.

EDIÇÃO É VOLTADA PARA O MERCADO ALVO
"Um lance errado pode empregar ou desempregar no futebol", diz Ivan Ricardo, proprietário da ARF. Por isso, a empresa trabalha com entendimento “boleiro” do mercado alvo que pretende ser atingido pelo jogador que contrata o serviço.
Segundo a empresa, um material destinado a interessados na Ásia deve priorizar a velocidade do jogador, seu dinamismo na participação no jogo. Na Europa, geralmente o empenho tático do atleta acaba sendo mais valorizado.
"Quando a gente pensa mercado Europeu, por exemplo. Analisar a tática que é usada nesses mercados. Europa joga muito no sistema 4-4-2. Se a gente pensar num lateral, por exemplo, não podemos caracterizar ele com um ala. Precisamos priorizar as imagens dele na marcação. Que ele marque muito bem. Jogar avançado é o algo a mais, não o principal para impressionar", diz o empresário.

GRANDES JÁ ACERTARAM E ERRARAM AO APOSTAR NOS DVDs

Oswaldo de Oliveira não queria Diego Lugano no São Paulo em 2003, mas o então presidente do clube, Marcelo Portugal Gouvêa, se encantou por um DVD do zagueiro e bancou a transação. O uruguaio acabou campeão do mundo no Morumbi e ídolo da torcida.

O argentino Matias Defederico chegou ao Corinthians graças a uma coletânea de lances impressionantes pelo Banfield, contida em um DVD. O meia acabou não vingando no Parque São Jorge e voltou ao seu país.

O lateral esquerdo Monzón foi oferecido ao Fluminense por um empresário, e o técnico Abel Braga assistiu a um DVD do atleta antes de avalizar o negócio. O jogador do Lyon fica nas Laranjeiras até o fim do ano.

Em 2010 o colombiano Cristian Borja chegou ao Flamengo depois de agradar no DVD, mas não caiu no gosto da torcida e deu dor de cabeça para o então diretor Zico.

Em 2012 o Cruzeiro contratou o lateral direito Jackson, junto ao Dallas, dos EUA, por DVD. Os dirigentes revelaram que gostaram do jogador após receberem filmagens do empresário. Mas o atleta deixou o time pouco tempo depois da sua chegada, sem jogar.

O atacante argentino Escalada foi contratado com grande expectativa pelo Botafogo em 2008. Desembarcou no Rio com muitos quilos a mais e jamais conseguiu entrar em forma.

*com colaboração dos escritórios de Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre

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